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Desesperança

Me dá uma desesperança danada quando vejo as vozes dos jovens pretos chorando as dores que carregam em seus pesados corpos com tão pouco tempo de vida. Eu choro com eles porque não posso tirar essa dor do peito deles.


Choro porque lutei tão pouco para evitar essa dor dilacerante que invade a alma de quem só quer trilhar seu caminho com a serenidade que lhe é negada.

O choro, o grito, o silêncio, a raiva, a apatia, a desistência. Sentimentos que movem seus dias, sempre, todos os dias. Não dá pra esperar pelo amanhã, é só o hoje, sempre hoje, o hoje que pode terminar hoje ainda.

A imobilidade é a minha dor maior. Que nada significa diante a imensidão da dor da mãe que perde um filho cravado de balas, corpo perfurado como um pedaço de papelão usado no treino de tiro ao alvo.


Na minha insignificante dor, imagino que, se fosse eu essa mãe, pensaria não em justiça, mas em vingança. Arrancar os olhos dos malditos, jogar os corações para os ratos dos bueiros fétidos, deixar os restos de carne apodrecendo ao sol desértico. É o mínimo que merece ser feito.


Quando ouço a meninada preta buscando nas rimas cantadas da poesia, no movimento nervoso dos corpos, seu instrumento de luta, choro de emoção, é muita boniteza.

Choro de desesperança, porque o caminho da juventude preta é muito longo, tortuoso, espinhento demais.

Choro porque não é justo, não é coerente, é cruel.

Eu ouço os gritos dos pais dos jovens que tiveram as vidas ceifadas e me sinto uma inútil. O racismo mata quem vai. Dilacera quem fica. Destrói famílias, sonhos, esperança.


Desperta ódio, dor, doenças. Desesperança.


texto original em: http://blogueirasnegras.org/category/identidade/infancia/

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